Observador Lifestyle Especial Comida
Tipo de Trabalho: Editorial
Editora: Cinco Um Zero
Ano: 2019
Função: Edição executiva, coordenação, produção de textos. 

Com direção de arte de Luís Alexandre.

Assumi a edição deste número da Observador Lifestyle dedicado à gastronomia, que ganhou Prata e Bronze no Festival CCP 2020 e foi distinguida com Melhor Projecto Gráfico nos prémios Design Meios e Publicidade do mesmo ano.

O fecho de edição coincidiu com a morte da pessoa responsável por eu gostar tanto de estar à mesa. Dediquei-lhe o editorial:

“Tínhamos um acordo tácito: sempre que ela fazia torta de doce de ovos, chamava-me para rapar o tacho do doce. Em troca, comprometia-me a nunca deixar comida no prato, mesmo em dias de pescada cozida. Nunca deixei.

Se nos últimos dez anos escrevi sobre gastronomia, a culpa terá sido, em boa parte, da minha avó Didi e das suas receitas. O supracitado doce de ovos, o soufflé de bacalhau que víamos crescer na cloche, os croquetes e rissóis inigualáveis ou o entrecosto no forno com as batatinhas gulosas que só ela sabia fazer. Habituei-me ao melhor, em casa, para escrever sobre o quase tão bom, fora dela.

O tema principal desta revista, sobre sustentabilidade (p.12), podia ter sido escrito por ela. Não desperdiçava nada, sabia de cor as épocas de todas as frutas e legumes, usava os animais do nariz à cauda e quando comprava peixe preferia as espécies abundantes.

Os pratos da minha vida são os dela. Se não fossem, podiam ser alguns dos que oito grandes chefs nacionais escolheram de entre todos os que criaram (p.30).

Discutimos algumas vezes sobre tatuagens: ela não compreendia por que razão certas pessoas decidiam, passo a citá-la, “riscar o corpo”. Nunca a consegui convencer e julgo que nem o trabalho ilustrado pela Marta Teives sobre tatuagens de chefs o faria (p.52).

Poderia ter largado tudo para trabalhar num restaurante (p.64). Talvez a Michelin lhe desse uma estrela para ela, mais tarde, a entregar e se dedicar aos netos (p. 88).

Vinhos não eram a sua praia: bebia um copo à refeição, dois em dias de festa. Mas nunca terá tocado num Barca Velha (p. 116) ou num Niepoort (p. 122). Preferia o vinho que o meu avô trazia da terra, bem mais natural do que convencional (p. 134).

A Didi já não vai ler esta revista. Mas uma coisa é certa: esta revista não teria acontecido sem ela.”